Colcha de Retalhos

"O homem é um deus quando sonha e não passa de um mendigo quando pensa." Holderlin

Textos

ANO VELHO, ANO NOVO...

Sinto-me uma criança que não conhece o espelho. Tento juntar meus fragmentos, reencontrar-me na imagem projetada dos outros... Acompanhei minha sombra sem traços num chão estilhaçado e descontínuo, mas não me reconheci... Perdi-me na multidão... Perdi-me, talvez, na ausência...

Deixo as palavras no meio-fio. Liberto-me da narrativa como se pudesse me encontrar destelhada sob um céu renovado. Desatenta, tropeço em uma nova calçada...

No trajeto rotineiro, busquei a inspiração para a última crônica do ano. De repente, um pequeno parágrafo ventou na face das emoções. Reticente, como são as brisas, a afirmação inaugurou uma nova face da repisada indagação: O que sou no mundo? A pergunta perfurou as inquietações, trouxe-me um recorrente sentido de perda e finalmente resvalou na impossibilidade de compreender o que encontraria na imagem projetada nos olhos alheios se, distante, permaneço caminhando em busca de ser a mulher que se reconhecerá em alguma realização da criança que encasulou.

Nos rostos entardecidos no caminho, encontrei estampado um misto de sentimentos, ansiedades, desencantos... Achei a impressão das notícias que teimam em preencher os dias e aterrorizar as noites, lançando os sonhos para precipícios dominados por homens inatingíveis. Gigantes que lançam os inocentes em grandes quedas ou os deixam secar aprisionados nos condenáveis desertos. Magos que despertam os sonolentos para falsas realidades. Deparei-me, talvez, com a imagem da própria desilusão fragmentada num espelho infantil, talvez com a esperança para recomeçar a luta por um ideal coletivo...

As palavras não se deixam abandonar e me seguem. Atravessam os cruzamentos não sinalizados e me encontram como lufadas de lucidez e mistério. Sinto-me uma criança que não conhece o espelho...

O pensamento deságua no solo trêmulo das mãos. No papel, palavras secas navegam, criam asas e redesenham um horizonte distante dos planos da realidade... Sobrevivem as obscuridades numa confissão metafórica, teimam em apagar a chama de uma emoção fadada ao abandono. Mais uma alegoria entrega a paixão dos vícios, o recato das ilusões, a indiferença dos ausentes... Perdi-me, talvez, na ausência... Um verso finaliza o texto com o encontro de um novo começo.

As mãos se rendem ao céu possível das fantasias e projetam no infinito a grandeza de um vôo.  

Feliz Ano Novo!!!
Helena Sut
Enviado por Helena Sut em 25/12/2005


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