BORDADOS ABSTRATOS
Suaves acordes desenham no abstrato um anseio. Sinto-me eclipsar pela magia musical. Desaparecida sob os véus da misteriosa arte, construo o enredo com as palavras presentes. Sensações dominam o corpo levemente em busca de uma realização. O ventre se contrai, vazios preenchem exaustivamente meu peito, as pernas descansam recostadas ao chão enquanto os olhos se perdem nos fugidios horizontes.
Desejo... Eis o desejo a invadir a intimidade exigindo satisfação. O corpo e a alma se costuram num bordado indecifrável. Talvez alguma linha de romantismo com tons de vivência, talvez apenas a certeza de estar viva, talvez... Hesitações se desdobram em descobertas, novos conhecimentos amadurecem nas entrelinhas da linguagem metafórica. O que digo nos emaranhados fios? Como me transformo em reflexos plurais de imagens sombreadas? Necessito costurar os fragmentos, perceber o desenrolar da história tão gravada no corpo nas sensações que novamente provocam meu descanso. Como decifrar meus retratos coloridos escondidos no baú de lembranças? O olhar encontrado no horizonte tardio. Uma nova percepção de estar no mundo – estar preenchida de tudo que é mundo e não o ser. Viver entre os anjos e os demônios e também não os ser. Estar no mundo com a ambigüidade das minhas bondades e perversões, alimentada dos prazeres e bordar a satisfação nos encontros concebíveis. O corpo expande-se para além do eclipse. As sombras de representação abandonam a extensão do ser e resgatam no campo de visão as alegorias do estar no mundo. O ser amadurecido, a mulher, a criança, tudo sou eu, desenhado nas entrelinhas do bordado. As satisfações sempre serão fugidias enquanto buscar o horizonte da origem da própria natureza ou me posicionar como uma estranha que se adapta e aceita a vida como possível. A história só se tornará em um bordado definitivo quando abandonar o caminho da humanidade e assumir que sou o mundo. Os ciclos, as rotações, as inconstâncias e incertezas, o todo e os fragmentos... Os olhos se perdem nos fugidios horizontes, enquanto nasce em meu corpo um sorriso infantil. As pernas estruturam-se em novos passos marcados de dores, felicidades, desencantos e fantasias. O ventre se expande em um novo ciclo, alimentando a inquietação no peito. Projeto novos anseios, novas perspectivas... Os acordes distantes se aproximam em suspiros, murmúrios, choros e risos... Sou sagrada e profana, música e silêncio, realização e desejo fugidio... Desperta do devaneio... Sou o mundo!
Helena Sut
Enviado por Helena Sut em 10/06/2005
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